COLUNA

Ainda dá tempo?

Dicas de Mulher

Com os dias escorrendo pelos dedos, vivemos nos perguntando se os planos deixados para trás ainda podem virar realidade

Sempre que abro meu aplicativo do banco para fazer um pix, lembro da época em que eu era adolescente e ia ao banco para pagar as contas. Os boletos chegavam religiosamente pelo correio, juntávamos todos em um bolo só e tirávamos uma manhã (ou um dia todo) pra quitar. Seguíamos até a agência, ficávamos na fila por muitos minutos ou horas, sem celular ou qualquer tela para distrair. Ali, conversávamos com o segurança, com a senhora da fila preferencial e com o fulano logo atrás.

Não importava a pressa: o ritual já era previamente demorado e, se déssemos sorte, conseguiríamos resolver tudo pelo caixa eletrônico, sem precisar pegar a bendita senha e seguir para o atendimento da “moça do caixa”. Sair do banco com os boletos pagos era quase uma vitória hercúlea de ter vivido o ritual mais um mês e jamais imaginávamos que um dia faríamos tudo isso pelo celular, em dois minutos.

Agora, quando tento racionalizar a noção de tempo, compacto essa memória e vejo que hoje o tempo voa, amor, escorre pelas mãos, mesmo sem se sentir… E mesmo que não há tempo que volte, eu fico me perguntando: o que eu estou fazendo com o resto dos 58 minutos que me sobraram daquela hora em que fiz o pix? Provavelmente, correndo pra lá e pra cá, dando conta de checklists e incontáveis tarefas que envolvem telas, áudios, networking e imposto de renda.

Não sou só eu. Ouço no consultório, nas rodas de amigos, nas filas que ainda temos de pegar: o tempo está voando! Será que ainda dá tempo de passar na farmácia? Ainda dá tempo de tomar um café? De pedir perdão? Ainda dá tempo de trocar de carreira? Dá tempo de me casar de novo? De ser mãe? Dá pra mudar a rota, mudar de ideia, trocar de time? Tem tanta coisa acontecendo, e de forma tão rápida, que nos sentimos velhas demais pra isso, e a única forma de parar o tempo é pagar o botox, o congelamento de óvulos, o consultor e o cirurgião plástico. Por isso seguimos correndo pra ganhar muita grana pra conseguir bancar tudo isso, sem perceber que o tempo é relativo.

Seguimos a vida achando que a morte vem quando estivermos velhos, perto dos 70 anos, e somos surpreendidos quando alguém jovem se vai. É nos velórios e sepultamentos que paramos o corpo pra ver o tempo passar e nos perguntamos se a direção automática da vida está, de fato, nos agradando. Aí é que vemos a urgência das coisas e parece que não dá mais tempo de nada!

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Acho que, se você está lendo este texto, é porque tem algo a ser feito de forma urgente. Se perguntar se ainda dá tempo, na verdade, é se perguntar se vale a pena. Qualquer caminho que mude de rota exige deixar algo para trás. Para encontrar um novo amor, é preciso perder um pouco das certezas que a vida te trouxe. Para abrir um novo negócio, é preciso perder a segurança financeira que você teve até aqui. Para ter um filho, é preciso perder a tranquilidade das noites de sono (para todo o sempre, provavelmente). No caso de ir atrás do que você sonha, a pergunta a ser feita não é sobre o tempo, é sobre a perda. Será que você topa perder um pouco para talvez ganhar?

Aproveite o tempo que você tem para saber quem você é

Em vez de desperdiçar os minutos economizados com tarefas rápidas, use-os de forma a se conectar consigo mesma. Pergunte-se: “como posso me conhecer melhor?” Muitas vezes, os planos mudam e o que fazia sentido para nós há 10 anos já não faz mais. Compreender se o que você deseja ainda mobiliza a mulher que você é hoje é fundamental.

Aceite mudar

Qualquer mudança exige deixar algo para trás. Novo amor, novo negócio ou ter um filho – todos requerem sacrifícios. Pergunte-se se vale a pena perder um pouco para ganhar muito, ainda que esse ganho não seja garantido. Pode ser muito bom saber que, pelo menos você tentou, ainda que não dê certo.

Pensar demais é fazer de menos

Se há algo que precisa ser feito, faça agora. Não espere o momento perfeito, pois ele pode nunca chegar. A idealização é a pior inimiga da realização, e devemos saber que nada será 100%, todos os cenários têm pontos negativos e positivos.

Não jogar também é perder

Se você evita entrar no jogo para evitar perder, saiba que você já está perdendo. Ficar parada olhando a vida passar também é uma forma de sofrimento. Não há vida plena sem arriscar e somos completamente capazes de nos reconstruir depois de uma queda. Sabendo que você pode perder ou ganhar, que tal aproveitar o jogo? Se a resposta for sim, o tempo, no final das contas, pouco importa – por isso, ainda dá!

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Dicas de Mulher.

Psicanalista e Palestrante, graduada em Psicologia e em Letras, com Mestrado e Doutorado em Linguística e Pós-Graduada em Sexualidade Humana. Dedica sua carreira ao desenvolvimento de mulheres líderes no trabalho, nos relacionamentos e na vida. É autora do livro "A linguagem da loucura" e empresária, ama comunicação, esportes, viagens e celebrações.