COLUNA

Deem largada às retrospectivas: 2022 está no fim

Thays Pretti

Depois de um ano tão desafiador, nada melhor do que levantar a cabeça de dentro d’água e respirar

Em 30.11.22

Falta um mês para 2022 acabar. Eu poderia esperar mais um pouco para entrar em modo de encerramento de ciclos e retrospectivas, mas o fato é que essa mistura de eleições, governo de transição, mortes de grandes artistas (te amo para sempre, Gal), Black Friday, Copa do Mundo e preparação para o Natal e Ano Novo tem me deixado exausta. Então, nada mais justo do que desejar boa noite mais cedo para quem fica e começar a apagar as luzes do ano.

Na primeira coluna que escrevi neste espaço, falei sobre minha teoria de que 2022 era “o ano do cansaço”. Isso foi em abril. Àquela altura, eu não imaginava o quanto isso seria verdade. Foi só um palpite, uma brincadeira sobre como já me pesavam os ombros com o ano ainda recém começado. Hoje, sete meses e 25 textos depois, ratifico: 2022 definitivamente é (foi?) o ano do cansaço.

Sobre 2023, ainda não sei. Gostaria muito de dizer que será o ano da esperança, mas acho que vale segurar a expectativa mais um pouco. Até porque tem tantas coisas bizarras acontecendo, como as pessoas abandonando o Twitter depois de sua compra pelo Elon Musk ou o fato de uma parcela da população brasileira acreditar que o presidente Lula morreu e foi substituído por um sósia, que acho que qualquer julgamento feito hoje sobre o que vai ser o ano que vem pode ser demasiado apressado.

Já podemos, porém, focar nas tais retrospectivas. Gosto muito delas – desde aquelas no Instagram ou Spotify até as que fazemos olhando nossas próprias experiências de vida. Além de amar ver as retrospectivas dos outros, gosto de fazer as minhas: lembrar de tudo o que ouvi e li, com quais pessoas passei meu tempo, que vontades realizei, o que conquistei. Acho saudável o gesto de parar e observar, analisar e planejar os próximos passos. Em um mundo que nos exige tanto que andemos adiante, olhar para trás é quase subversivo.

É claro que, quando digo isso, não falo do tão perigoso saudosismo. Ele é idealista, faz as pessoas enxergarem o passado através de uma lente cor-de-rosa, cheia de afetos inventados. Daí passam a achar que suas infâncias e adolescências eram melhores do que as de hoje, ou que o período da ditadura militar teve algo de positivo, essas coisas absurdas. Não é assim, sabe? É apenas essa lente impedindo de ver as dificuldades que existiam – e o quanto avançamos socialmente (apesar de nunca ser o suficiente).

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Então, repito: não falo de saudosismo. Falo sobre lançar um olhar de avaliação, entender o que foi feito de positivo e negativo, se realmente nos movemos adiante ou se ficamos apenas patinando no mesmo lugar – o que é uma possibilidade. Na urgência que nossa sociedade nos impõe de ir sempre em frente, às vezes caímos numa imprecisa emulação de movimento, uma agitação frenética que nos impede de enxergar que, na verdade, não estamos saindo do lugar. É a areia movediça da sociedade contemporânea. Para fugir dela, é fundamental respirar fundo, com calma, sem afetação.

Além disso, outra coisa que é importante perguntar ao olhar para trás é: será que eu fui feliz durante este ano? Eu sei, estamos em 2022. “Feliz” pode soar meio forte. Talvez “alegre” ou “satisfeito” soe um pouco mais realista. É possível, sim, que “exausto”, “preocupado”, “à beira de um burnout durante a maior parte do tempo” definam melhor como nos sentimos em 2022. Mesmo assim, um ano é bastante tempo. Muita coisa acontece. Com certeza realizamos algumas coisas, aprendemos sobre nós mesmos, nossas relações, o mundo. E acho que, mesmo que possamos estar na “areia movediça” em alguns campos da vida, é quase impossível estarmos completamente iguais a como éramos quando o ano começou.

Claro que, quando focamos muito em algumas áreas por um motivo ou outro, deixando outras desassistidas, pode ser que fechemos o ano como aqueles marombas de academia que só treinam os braços. Eles ficam meio triangulares: grandes em cima, magrinhos embaixo. É por isso que é sempre bom parar e avaliar. Só assim a gente entende se está dando atenção a tudo o que importa e, mais do que isso, em quais campos sentimos estar rumando na direção certa.

Sei que nem sempre a gente pode fazer algo em relação ao que não deu lá muito certo, é claro. Não sou coach nem a Xuxa de Lua de Cristal, para quem ‘tudo pode ser, se quiser, será’. Há variáveis, há conflitos políticos e sociais, há a crise, há a inflação. São muitas coisas sobre as quais não temos controle no meio do caminho. Só que, em relação àquelas sobre as quais eu tenho controle, tenho me perguntado bastante se estou fazendo o melhor que posso.

Comecei minha avaliação neste finalzinho de novembro. Abri espaço na agenda para planejar dois projetos pessoais que quero colocar em prática em 2023, mudei o prumo de algumas navegações, engavetei um projeto para mais tarde – porque nem tudo dá para levar adiante, e tudo bem. Revi no ‘Skoob’ o registro dos livros que li durante o ano, atualizei o que tinha esquecido de registrar, separei o que ainda dá tempo de ler neste ano. Olhei com atenção para as minhas finanças, tentando colocar as coisas um pouco mais na ponta do lápis e avaliar como eu quero usar e valorizar o tempo que eu tenho. Estou pensando também sobre minhas relações, no que eu investi afetos, o que valeu e o que não valeu. O que eu poderia ter feito diferente, o que não quero repetir. E quais são as chateações e mágoas que enterro em 2022 e quais eu ainda preciso elaborar melhor dentro do peito.

Nesse processo, volto também as playlists ouvidas durante o ano, tocando novamente em looping enquanto planejo 2023. Afinal, ainda espero conseguir emplacar um ou dois artistas que não ouvi tanto quanto deveria na minha retrospectiva de mais ouvidos do ano. Objetivo bobo, eu sei. E ainda bem, porque já não tenho mais energia para grandes feitos. É como diz um amigo em tom de graça: “agora, é só depois”. Então, estou assim, trabalhando com metas pequenas, mensuráveis, alcançáveis no curtíssimo prazo. Guardando energia para correr o próximo sprint.

Tudo isso é bonito. Apesar de haver algumas coisas para realinhar, a gente vai percebendo aos poucos o quanto caminhou e mudou no processo. Eu sou bem diferente da pessoa que começou 2022. Além disso, este ano eu me entendi como alguém bastante adaptável e resiliente (haja resiliência para superar este ano, acho que essa é uma habilidade que a gente precisaria aprender na escola).

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Queria muito dizer que o ano que vem vai ser melhor para todos nós, mas isso está fora do meu controle (e do seu também). O que está nas minhas mãos é tentar ser uma pessoa melhor para o mundo. Sei que é idealista da minha parte, mas, se cada um de nós tivesse apenas isso como principal objetivo, talvez a gente conseguisse, como consequência, um ano melhor para todo mundo. Pode ser um bom objetivo para colocar na lista de 2023.

Boas retrospectivas e planejamentos para todos nós!

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Dicas de Mulher.

Escritora, autora de "A mulher que ri", "Efêmeras" e "Do Silêncio". Apaixonada por Clarice Lispector, clubes de leitura e pessoas. Gosta de listar coisas de três em três. Escrevo a newsletter Versilibrista.