COLUNA

Por que não consigo deixar esse ressentimento?

Dicas de Mulher

Situações que você considera imperdoáveis dizem mais sobre você do que sobre quem te machucou

Existe uma diferença sutil entre mágoa e ressentimento. Uma mulher magoada se sente triste, tem raiva de quem a fez sofrer, chora e pode gritar aos quatro ventos sobre o quanto está machucada, sabendo que quem a magoou é alguém a quem ela ama – e odeia, ao mesmo tempo, pelo mal causado. Uma mulher ressentida nem sempre deixa escapulir a dor. Sofre, também magoada, mas guarda disso uma amargura que a acompanha em forma de troféu.

A título de exemplificação, vamos pensar em mágoas clássicas: há pessoas que tiveram relações ruins com seus parceiros, ou que foram traídas. Dessas relações, elas podem sair magoadas e feridas. Posteriormente, podem reagir, com ou sem violência, para compreender, na terapia ou em outro lugar de análise, que também erraram ou que nem todo mal precisa ser levado adiante.

Talvez, essas mesmas pessoas não querem compreender nada disso. Ao contrário, seguem a vida praguejando o que o antigo parceiro lhe fez, sem qualquer questionamento ou vontade de entender o acontecimento, terceirizando, assim, toda a culpa, em um movimento sádico (e masoquista) de acreditar que a culpa é do outro. Sádico porque a humilhação do outro lhe dá prazer. Masoquista porque o ressentimento dói – e é algo de que o sujeito não quer se curar.

Por que uma pessoa ressentida não iria querer se curar de algo que dói?

A relação entre dor e prazer é profundamente estudada na psicanálise (longa história para outros textos que virão…), mas, resumidamente, há muitas situações dolorosas que mantemos pulsantes para que tenhamos ganhos secundários. Ganhos que, com frequência, estão atrelados ao nosso narcisismo. O ressentimento é um bom exemplo: cultivar esse sentimento por toda a vida significa nunca sair do lugar de quem está certo.

A pessoa ressentida é aquela que não quer saber qual é a sua parte no conflito, na crise. Não digo aqui que devemos perdoar aquilo que acreditamos ser imperdoável, mas, em muitas instâncias, o ressentimento vai além da questão entre perdão versus não perdão. Ele diz sobre reação àquilo que dói.

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A vingança não é uma defesa

Os impulsos de defesa são necessários. Voltemos ao exemplo de antes: uma mulher traída pode – e deve! – reagir. Defender-se, afastar-se, impor seus limites. A raiva, o ódio, como representantes da defesa, nos levam a tomar decisões que são importantes para nossa sobrevivência.

De outro modo, essa mesma mulher traída pode não reagir. Pode se manter em uma relação de traições constantes, repetindo copiosamente o quão boa esposa ela é e que não merece viver tal situação. Nessa posição, é comum que, com o passar dos anos, a relação se torne um poço de pequenas vinganças. Críticas constantes, cobranças de coisas que se passaram há anos, comportamentos sádicos com o parceiro que traiu, como se isso fosse, de alguma forma, compensar o sofrimento passado.

A vingança é típica do ressentimento. Ela escancara uma falta de coragem de se defender prontamente daquilo que nos machuca e coloca em evidência uma grande falha em nós: a dificuldade de tomar as rédeas da própria vida. Assim, é mais “fácil” passar a vida ressentida, criticando quem errou, do que assumir a impotência de mudar o cenário e reagir à dor. Mudar, ainda que seja pela via da raiva: essa é a saída para uma vida sem ressentimentos.

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Dicas de Mulher.

Psicanalista e Palestrante, graduada em Psicologia e em Letras, com Mestrado e Doutorado em Linguística e Pós-Graduada em Sexualidade Humana. Dedica sua carreira ao desenvolvimento de mulheres líderes no trabalho, nos relacionamentos e na vida. É autora do livro "A linguagem da loucura" e empresária, ama comunicação, esportes, viagens e celebrações.