Envato
É fato que família não se escolhe. Apesar desse núcleo ser responsável pelas primeiras relações sociais do ser humano, nem todo vínculo familiar é saudável e positivo. Para compreender melhor sobre o assunto, confira o que as psicólogas Beatriz Lima Figueirêdo (CRP 13/6972) e Rebeka Nascimento dos Santos (CRP 05/58097) falam sobre família tóxica.
O que é família tóxica?
Provavelmente você já ouviu falar em pessoas tóxicas ou relacionamentos abusivos, afinal esse tema tem sido muito abordada atualmente. Mas você sabia que a família também pode ser tóxica e ter comportamentos abusivos?
Segundo a psicóloga Beatriz Lima, “família tóxica ou disfuncional é aquela que frequentemente tem comportamentos não-saudáveis, como chacotas, mentiras, chantagens e manipulação, dando margem a sentimentos de angústia e sofrimento”.
Publicidade
Além disso, Rebeka Nascimento ressalta que “o termo família engloba todos os membros que compõe a estrutura familiar, como pai, mãe, avós, tios, irmãos, cônjuges , filhos, entre outros”. Além disso, o padrão de comportamento tóxico pode proceder de uma ou mais pessoas do grupo familiar.
Relacionadas
A especialista Beatriz explica que, “devido às questões morais que perpassam a ideia de família como entidade indissociável que deve permanecer unida apesar de tudo”, os conflitos relacionados aos comportamentos tóxicos se tornam ainda mais complicados.
Por causa desse sentimento de necessidade de permanecer unido, a relação pode causar prejuízos tanto para a qualidade de vida da vítima quanto para sua saúde mental.
Danos causados por uma família tóxica
A pressão moral relacionada aos vínculos familiares “dá margem a cobrança de si mesmo e dos outros, por aceitação de inúmeros abusos simplesmente pelo fato de ser família”, ressalta Beatriz. Isso causa uma série de danos psíquicos à vítima dessas atitudes. Os mais comuns são:
- Dificuldade de se envolver afetivamente com outras pessoas;
- Medo de ser manipulado;
- Autocrítica elevada;
- Autoestima baixa;
- Dificuldade em lidar com conflitos pessoais;
- Dependência emocional;
- Ansiedade;
- Estresse;
- Depressão;
- Transtorno de personalidade.
Beatriz afirma que “é natural que pessoas que cresceram em um ambiente tóxico carreguem consequências dessas vivências”. Contudo, as profissionais destacam que há formas de lidar buscando a diluição do sofrimento causado pelo ambiente abusivo.
Características da família tóxica
Beatriz explica que “é difícil definir se uma relação familiar é tóxica ou não através de uma ou outra característica”. No entanto, as psicólogas revelam alguns sinais que podem servir de alerta para identificar tais atitudes. Veja abaixo:
Manipulação
É uma das características mais comuns das atitudes tóxicas. De acordo com Rebeka, “a manipulação pode ocorrer através de comportamentos ou palavras” e geralmente ocorre de forma passiva-agressiva.
A profissional pontua que a ação é utilizada geralmente para “conseguir atenção da vítima”, fazendo com que essa, por sua vez, se sinta obrigada a agir contra sua vontade para o suposto bem do outro.
Chantagens psicológicas
Segundo Rebeka, a chantagem psicológica pode aparecer de diversas maneiras, como por exemplo “uma chantagem pautada pela vitimização, a chantagem fundamentada por uma promessa de recompensa e até mesmo a chantagem baseada em punição”.
Todas elas fazem a vítima novamente “se sentir submetida a realizar algo que não deseja com o intuito de amenizar os conflitos”, esclarece a psicóloga.
Excesso de controle
O excesso de controle também aparece constantemente nos comportamentos tóxicos de uma família. Rebeka explica que isso ocorre porque “os familiares se colocam numa posição soberana em relação à vítima”.
Esse controle “impõe a crença de que a vítima não é capaz de fazer nada sem esse núcleo familiar”, e, ao mesmo tempo, não disponibilizam espaço para que a pessoa possa realizar suas próprias escolhas e tomadas de decisões.
Falta de comunicação
Sabe-se que em qualquer relação a comunicação clara é necessária. No entanto, “em um ambiente familiar tóxico, a comunicação se torna escassa ou até mesmo inexistente”, afirma a especialista Rebeka.
Publicidade
Isso acontece “pela individualização de seus membros”. De acordo com a profissional, “cada indivíduo vive de acordo com a sua própria verdade”, o que não dá espaço ao outro de comunicar e falar abertamente sobre seus conflitos.
Conflitos constantes
Ambas as profissionais ressaltam que, justamente pela falta de diálogo, de compreensão e reciprocidade, os conflitos se tornam constantes em um âmbito familiar abusivo. “É comum a ausência de respeito entre os membros, que costumam não se preocupar com o sentimento do outro e sentir empatia para com ele”, pontua Rebeka.
Além disso, ainda segundo a psicóloga, “os conflitos podem ser verbais ou físicos, passivos ou agressivos”, e se tornam desgastantes emocionalmente para quem está constantemente inserido nesse contexto.
Nível elevado de exigências, expectativas e cobranças
“Por ter um posicionamento mais centrado em si mesmo, o familiar tóxico costuma impor um nível elevado de cobranças e exigências em relação à vítima” conta Rebeka.
A profissional revela que eles fazem isso “no intuito de que a vítima supra suas necessidades e expectativas” e que, por esse motivo, também é comum que “o vínculo seja baseado em críticas severas”.
Depreciação
Desencadeada pela falta de respeito, empatia e exigências, “a depreciação também se faz comum nessa relação”, afirma Rebeka. “Pelo fato da vítima não dar conta de suprir todas as expectativas impostas, ela é automaticamente colocada num lugar de inferioridade e incapacidade”, sendo alvo de chacotas e atitudes negativas voltadas a ela.
Dependência de álcool ou outras drogas
“A convivência com um adicto gera muita instabilidade emocional”, explica Rebeka inicialmente. De acordo com a profissional, “os conflitos vivenciados em um núcleo familiar que possui um dependente químico é extremamente desgastante emocionalmente”, o que torna essa relação disfuncional e desequilibrada.
Falta de responsabilidade afetiva
Outro fator pontuado por Rebeka é a falta de empatia dentro de uma família tóxica. Isso corrobora para comportamentos e ações que “geralmente desvalorizam ou menosprezam qualquer sentimento exposto pela vítima”, fazendo-a muitas vezes acreditar que não possui o direito de se magoar, sentir tristeza ou raiva por algo ou alguém.
Não costumam se desculpar
Por estar centrado em si “o familiar comumente se valida de razão por suas atitudes e por esse motivo dificilmente pede desculpas por agir de determinada maneira”, afirma a psicóloga Rebeka.
Entretanto, a psicóloga conta que quando ocorre um pedido de desculpas “pode haver manipulação nas informações do diálogo”, geralmente colocando a vítima como a culpada pela ação tóxica.
Como a psicóloga Beatriz informou anteriormente, não é uma determinada característica que define uma família disfuncional. Todavia, se em seu âmbito familiar existem comportamentos que causam impacto no seu cotidiano e está afetando a sua saúde emocional, busque sempre a ajuda de um especialista.
O que fazer se você tem uma família tóxica
As profissionais explicam que não há receita que ensine como agir em situações como estas é interessante estabelecer algumas atitudes para amenizar esses conflitos. Se você se identificou com algumas características e sente a necessidade de fazer algo, confira quais atitudes podem te ajudar:
Observe quais são as atitudes tóxicas
Segundo Rebeka, observar quais as atitudes que mais te ferem em suas relações familiares é o primeiro passo na tentativa de atenuar o sofrimento ou amenizar os conflitos.
Além disso, a psicóloga afirma que “é importante compreender que não é porque a relação envolve laços sanguíneos e/ou afetivos que você deve normalizar brincadeiras ou comportamentos que lhe façam mal”.
Seja assertiva com seus limites
Ao compreender o que lhe magoa fica mais fácil entender os seus limites também. Isso pode te ajudar a não tolerar todas as atitudes das sua família.
“Deixe claro o que lhe afeta, diga não quando necessário e delimite o seu espaço pessoal e emocional”, ressalta a psicóloga Rebeka, que finaliza dizendo “todos possuem o direito sobre a própria vida e liberdade para decidir o que lhe faz bem ou não”.
Tenha uma válvula de escape
Beatriz conta que é importante buscar algo que possa te ajudar a lidar com essa carga de sofrimento, “seja conversando com alguém de confiança, escrevendo como se sente, fazendo alguma atividade relaxante, se exercitando e se for possível, buscando auxílio profissional”.
Tente estabelecer um diálogo
Rebeka afirma que nem toda família fornece espaço para um diálogo saudável. Entretanto, se você achar que isso é algo possível, é realmente interessante estabelecer uma comunicação.
“Diga o que lhe incomoda e como se sente em determinada situação”, ressalta a especialista. Além disso, a psicóloga conta que “em algumas situações a falta de diálogo pode fazer com que o outro não compreenda os seus limites e continue agindo de maneira tóxica”.
Distancie-se desses familiares
Obviamente cada caso é um caso, afinal todos possuem suas particularidades e refletem isso em seu âmbito familiar. Contudo, em determinadas situações o distanciamento se torna necessário, mesmo que não seja definitivo.
A psicóloga Beatriz destaca que é interessante manter uma distância minimamente saudável, mas que se uma distância física não for possível, “começar a tentar impor limites nesta relação é algo que pode ser benéfico à saúde mental”.
Busque ajuda profissional
Toda e qualquer situação tóxica causa traumas emocionais e uma série de fatores que impactam na saúde mental do indivíduo. Por isso, as profissionais concordam que ter um espaço em que você possa ser ouvida e acolhida se faz importante no processo de elaboração e diluição desse sofrimento.
Além disso, Rebeka destaca que “a psicoterapia pode ser realizada individualmente ou em família, e poderá proporcionar reflexões relevantes acerca dos vínculos estabelecidos e do padrão de comportamentos tóxicos”.
É de extrema importância se reconhecer como um ser humano autônomo e de direitos e identificar o seu papel dentro do seu núcleo familiar tanto para conseguir limitar alguns comportamentos tanto para não se cobrar em assumir uma postura de submissão aos abusos.
Saiba mais sobre família tóxica e entenda o prejuízo dessas relações
Compreender a dinâmica de família disfuncional é algo complexo, afinal nenhuma família é igual a outra. Contudo, os relatos dos profissionais a seguir poderão te auxiliar a ter novas perspectivas sobre a temática. Confira!
Nem toda relação familiar faz bem emocionalmente
Desconstruindo a ideia de que toda família é boa e possuí vínculos ideais, a psicóloga Marisa de Abreu esclarece o que leva um grupo familiar a ter comportamentos tóxicos. Marisa pontua ainda sobre as idealizações e expectativas depositadas nos laços familiares e o cuidado que se deve tomar em relação a isso.
Como lidar com uma família tóxica?
Pode parecer uma missão impossível se desvencilhar de um relacionamento tóxico quando se trata de família. Nesse vídeo, a psicóloga Anahy D’Amico explica sobre as maneiras mais adequadas de lidar com essa situação, além de esclarecer os impactos emocionais da convivência com uma família disfuncional.
Os papéis distorcidos em um núcleo familiar disfuncional
Nesse vídeo, o psiquiatra André Brasil aborda sobre os padrões comportamentais de uma família tóxica, além de alertar sobre a constante troca de papéis nesses núcleos parentais e as consequências negativas na vida de seus membros.
Mãe narcisista em uma família disfuncional
Quando se pensa em relacionamento de mãe e filho é fácil pensar em um vínculo afetivo e seguro, mas será que em toda família isso acontece? Nesse vídeo, a especialista fala sobre os impactos sofridos por um filho que convive com uma mãe narcisista e como isso torna o âmbito familiar tóxico.
Manter um relacionamento com pessoas tóxicas acarreta prejuízos marcantes para a saúde mental. Por isso, é importante se conhecer para entender seus limites e traumaspara buscar algumas resoluções. Se quiser saber mais sobre o tema, confira essa matéria sobre saúde mental, que pode te motivar a cuidar da sua!
Karyne Santiago
Psicóloga apaixonada por literatura e psicanálise. Acredita que as palavras, escritas ou faladas, têm o poder de transformar.