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Homofobia e LGBTIfobia são palavras usadas para se referir a intolerância e a descriminação de pessoas devido à sua identidade de gênero ou sexualidade, assim como a bifobia. A advogada Êmilie Gongola é especialista no assunto e conta um pouco sobre o assunto e seus desdobramentos na lei.
O que é a homofobia ou LGBTIfobia
Apesar de significar atitudes discriminatórias à pessoas homossexuais, a palavra homofobia é muitas vezes usada no sentido mais amplo em relação à intolerância com relação à sexualidade e a identidade de gênero, por ser mais conhecida.
A advogada explica que “a LGBTIfobia consiste na aversão, intolerância ou atitudes discriminatórias em relação à sexualidade, ou a identidade de gênero de pessoas LGBTIQA+”. A sigla LGBTIQA+, que também aparece como LGBTQIA+, se refere a lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais e travestis, intersexuais, queer, assexuais, arrômanticos e agênero, e outras identidades.
Origem dos termos
O primeiro registro do termo homofobia foi em 1971, quando o psicólogo norte-americano George Weinberg usou a palavra no seu livro “Society and the Healthy Homosexual” (Sociedade e a Saúde Homossexual, em tradução livre). Ela é formada pela união de dois radicais do grego “homo”, que significa igual, e “phobia”, que significa medo. Ele é usado para se referir ao ódio a pessoas homossexuais.
Muitas vezes, a palavra homofobia é usada de forma ampla para se referir a todos os preconceitos contra orientação sexual e identidade de gênero. A Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (ANTRA), em sua cartilha “O que fazer em caso de violência LGBTIfóbica?”, chama atenção para ser evitado usar a palavra homofobia como termo guarda-chuva. “Esse termo apaga a transfobia, ou seja, a opressão motivada na identidade de gênero, real ou suposta, das vítimas (contra travestis, transexuais, ou seja, a pessoas que não se identificam com o gênero que lhes foi designado ao nascer) e outras violência contra pessoas LGBTI+”.
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Assim, o sugerido é usar o termo LGBTIfobia quando referir-se a descriminação por conta de gênero e/ou orientação sexual sofrida pelas pessoas LGBTQIA+. E, no caso de situações específicas, a cartilha da ANTRA sugere usar os termos específicos, em caso de situações de opressão contra assexuais, acefobia, contra bissexuais, bifobia, contra lésbicas, lesbofobia, e assim por diante.
Como identificar comportamentos LGBTIfóbicos
A advogada explica que “muitas vezes, a LGBTIfobia se torna evidente com agressões verbais, físicas, sexuais e morais.” Porém, a discriminação também pode ser “discreta e sutil, disfarçando-se até mesmo de ‘opinião’: ‘tudo bem ser gay, mas não precisa beijar em frente às crianças’”, discorre Êmilie.
Ela deixa claro que a homofobia não se apresenta apenas pela violência, mas também por “comportamentos críticos e hostis, assim como a discriminação a partir da percepção de que todo tipo de orientação sexual não-heterossexual ou identidade não-cisgênera é negativa, é também LGBTIfobia!”
O que fazer ao presenciar casos de homofobia
Se for vítima de comportamentos lgbtifóbicos ou presenciar uma situação assim, a advogada explica o que deve ser feito: “o primeiro passo é sempre a denúncia, que pode ser feita através do boletim de ocorrência em delegacias especializadas (quando houver) ou em qualquer delegacia física ou online. Por telefone, é possível ligar no Disque 100 ou, em casos de flagrante, para o 190”.
O que a legislação brasileira diz sobre homofobia
A advogada explica que o Brasil ainda não conta com uma lei específica contra a homofobia. “No entanto, desde junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o crime de homofobia deve ser equiparado ao de racismo. Sendo assim, enquanto o Congresso Nacional não editar uma lei específica para a homofobia, as condutas homofóbicas e transfóbicas, serão enquadradas nos crimes previstos na lei 7.716/89 (Lei de Racismo).”
Dessa forma “Quando um indivíduo LGBTQIA+ é agredido por palavras ou fisicamente por conta de sua orientação sexual, ele pode ser protegido pelo artigo 20 da Lei 7.716/2018 (crime de racismo). ‘Praticar, induzir ou incitar a discriminação, ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa’. Se houver divulgação ampla de ato homofóbico em meios de comunicação, como publicação em rede social, a pena passará a ser de dois a cinco anos, além de multa”.
A cantora drag queen Pabllo Vittar, que conta ter sofrido muito com a homofobia durante a adolescência, por ser um menino afeminado, foi uma das celebridades que comentou sobre a criminalização da LGBTIfobia no Brasil. “Muitas pessoas morrem por causa disso, por serem quem são. Já estava mais que na hora. Pessoas continuam morrendo nas ruas. É o mínimo existir uma lei para que a gente saiba que tem alguém que se importa com nossas vidas”, contou a artista à revista Marie Claire.
Como a homofobia afeta os direitos de pessoas LBTQIA+?
A advogada Êmilie Gongola explica que a homofobia e a LGBTIfobia ferem diretamente os direitos das pessoas “porque ela nada mais é do que uma intolerância e uma violência em relação às vivências das pessoas LGBTQIA+, então a ligação é direta”.
Ela exemplifica com uma situação que “quando uma pessoa chama outra pelo nome que não é o nome que deveria chamá-la de acordo com a sua identidade de gênero, ela está ferindo um direito dessa pessoa, um direito fundamental, o direito ao nome, à dignidade”.
A LGBTIfobia também se apresenta de forma a ferir outros direitos, quando são negados a garantia de adoção ou casamento para casais homoafetivos, o preconceito nega a garantia à família. “Sem falar do direito à vida, o direito básico mais protegido pelo ordenamento jurídico. Vemos essa violação todos os dias. Diariamente pessoas perdem a vida por conta da LGBTQIfobia”, destaca a especialista.
Em 2021, 300 pessoas LGBTQIA+ morreram por causa de LGBTIfobia, segundo o relatório “Mortes Violentas de LGBTI+ no Brasil – 2021”, divulgado pelo Grupo Gay da Bahia (GGB). Esse número representa um aumento de 8% em relação a 2020. Foram documentados pela pesquisa 276 homicídios, que representam 92% dos casos, e 24 suicídios, correspondendo a 8% dos casos.
Pessoas LGBTIA+ também podem reproduzir homofobia?
A Êmilie Gongola informa ainda que a LGBTIfobia também existe entre pessoas LGBTQIA+. “Muitas pessoas LGBTQIA+ se concentram em suas próprias vivências, ignorando outras realidades presentes no ‘grupo’”, esclarece.
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Ela cita como exemplos desses comportamentos “duas afirmações muito reproduzidas no próprio meio em relação à bissexuais e à bissexualidade: ‘atiram para todos os lados’ ou ‘bissexualidade não existe, é só uma desculpa’”.
A cantora Halsey foi alvo de ataques como esses ao se assumir bissexual. Por estar namorando um homem na época, o rapper G-Eazy, ela recebeu comentários invisibilizando sua bissexualidade por estar em um relacionamento hétero. Aos quais ela respondeu em seus stories no Instagram: “então eu postei no meu Instagram para o Dia Nacional de Se Assumir que eu sou assumida e orgulhosa, e todo mundo está comentando coisas como ‘mas você não está namorando o G-Eazy?’ Então eu quero tomar um momento para fazer um anúncio de serviço público para lembrar vocês que – pessoas bissexuais. Nós existimos.” (tradução livre).
7 atitudes contra a LGBTIfobia
Você também pode fazer algo contra a homofobia e a LGBTIfobia. Mesmo quem não faz parte da população LGBTQIA+ pode tomar atitudes para garantir os direitos desse grupo e combater o preconceito. A advogada compartilhou alguns exemplos:
1. Lutar por políticas públicas de inclusão
Políticas públicas de inclusão são uma forma importante garantir que os direitos das pessoas LGBTQIA+ sejam protegidos e evitar que a descriminação as deixe à margem da sociedade.
2. Não se calar em situações de discriminação.
A advogada cita “não se calar diante de atitudes discriminatórias”, como uma ação importante. Deixar que atitudes discriminatórias passem sem ser contrariadas contribui para a normalização de práticas LGBTIfóbicas, portanto, deve ser evitada.
3. Analisar as próprias atitudes
Ela chama atenção para a importância de “fazer uma análise das próprias atitudes, evitando, assim, reproduções preconceituosas.” Para saber se tal atitude foi preconceituosa, é importante estar aberta a aprender.
4. Contratar pessoas transexuais e travestis.
Transexuais e travestis estão entre os grupos LGBTQIA+ que mais sofrem preconceito. A discriminação contra sua identidade de gênero ainda dificulta muito o acesso de pessoas trans ao mercado de trabalho, assim “contratar profissionais travestis e transexuais, quando empregador” é uma atitude importante.
5. Apoiar artistas e outras figuras públicas LGBTQIA+
A visibilidade de artistas LGBTQIA+ e de figuras públicas ajuda a disseminar assuntos e informações sobre as diferentes identidades de gênero e de orientação sexual. Isso contribui para que mais pessoas entendam os problemas que afetam as pessoas LGBTQIA+ e para a quebra de preconceitos.
A cantora Glória Groove, uma Drag Queen feita por um homem gay, falou sobre a importância da representatividade LGBTQIA+ no cenário artístico, após gravar um feat com a cantora Ludmilla, que é uma mulher bissexual. “É uma honra representar a nossa comunidade no cenário artístico. Consigo só imaginar o tanto de jovens que nos olham como referências de vida, carreira, atitude… Isso é muito forte e cria um mundo de possibilidades para futuros talentos que estamos inspirando” disse Glória Groove, em entrevista à revista Quem.
6. Lutar por direitos e denunciar quando eles são violados
É de extrema importância agir para que as pessoas LGBTQIA+ tenham seus direitos garantidos. É essencial denunciar casos em que eles são violados, para não passarem impunes.
7. Buscar ativamente por informações
Para entender o que são atitudes e falas preconceituosas, e o que pode ou não ferir determinado grupo, é preciso de muito estudo, leitura e escuta. Porém, não é possível esperar que todas as informações caiam de paraquedas em seu colo. A busca ativa sobre o tema se faz necessária sendo facilitada pelo acesso a conteúdos como esse.
Agora você já sabe como a homofobia e a LGBTIfobia afetam a vida das pessoas LGBTQIA+. As maneiras citadas são apenas algumas das coisas que você pode fazer para ajudar na luta contra o preconceito. Busque se informar sempre. Leia também essa matéria sobre gênero-fluído para entender melhor sobre a identidade e o preconceito de gênero.
Victória Vischi
Jornalista e produtora de conteúdo. Fã de cultura POP com interesse em Estudos Culturais, tentando acumular o maior número possível de hobbies nas horas vagas.