Dicas de Mulher
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Quem encontra Juliana Ferraz em megaeventos organizados por ela, ou mesmo acompanha suas colunas sobre body positive publicadas na Vogue e suas redes sociais, mal imagina um terço de sua trajetória. Hoje, aos 41 anos, a baiana é sócia-diretora da Holding Clube – um grupo de empresas do nicho de comunicação e marketing de experiência -, empreendedora no ramo da moda e influenciadora.
Sua carreira no ramo da comunicação, marketing e eventos começou ainda na Bahia, onde passou a trabalhar como assessora de imprensa e iniciou sua rede de contatos. Ao migrar para São Paulo, já nos primeiros anos, passou a trabalhar em empresas de destaque. Inicialmente, em 2004, a rotina de Juliana era fazer a ponte entre a imprensa e clientes da cartela da renomada agência In Press Porter Novelli, onde ficou por cerca de um ano e 10 meses.
Também atuou idealizando produtos editoriais e projetos de cross media, que oferecem uma experiência com mídias de diferentes tipos. Por exemplo, quando se faz um evento envolvendo um jogo de um torneio futebolístico, transmitido pela TV ou rádio, com uma quantidade x de pessoas reunidas; une-se o ON ao OFFLINE, no grupo Glamurama, por nove anos.
Ela também liderou a área comercial da MChecon Design & Cenografia, por cerca de dois anos e seis meses, entre os anos de 2016 e 2018, quando passou a integrar o time da Holding Clube, há quatro anos e cinco meses. Lá, tornou-se sócia no ano de 2020, e de 2021 para cá, paralelamente, também tem atuado como conselheira do Instituto Plano de Menina, cujo objetivo é capacitar e conectar garotas periféricas a oportunidades, para que “as tornem protagonistas de suas histórias”. Mas, até chegar ao patamar atual, Ju Ferraz passou por quedas e ascensões seguidas, como contou ao Dicas de Mulher em entrevista exclusiva.
A seguir, conheça a história da mulher que inspira outras a serem elas mesmas, se aceitarem e, assim, dar o passo inicial rumo ao que classifica como empreendedorismo da própria vida, aos próprios degraus.
Nascida no Sul da Bahia na década de 1980, numa família de classe média alta produtora de cacau, Juliana começou a trabalhar ainda aos 10 anos, numa organização não governamental (ONG) chamada Ser Down. Poucos anos depois, aos 15, ela praticamente foi forçada a começar a empreender de vez, para ajudar na composição da renda familiar, devido a morte de seu pai.
Além disso, houve na época a crise do cacau, que desembocou num cenário em que o país passara a importar a matéria-prima e chegara nas lavouras daqui, simultaneamente, a vassoura-de-bruxa (uma das doenças mais destrutivas já vistas em cacaueiros, causada pelo fungo Moniliophthora perniciosa e gera deformações, apodrecimento e também morte nos locais atingidos das plantações).
Nesse período, sua mãe, dona Luiza, teve de retornar às pressas ao mercado de trabalho, para manter Juliana e Lucas, seu irmão, bem. Antes desse episódio, apesar de ser dentista, dona Luiza se dedicava aos cuidados dos filhos e do lar.
Alguns anos depois, Ju Ferraz começou a trabalhar como assessora, ainda na Bahia. Por volta dos 23 anos, quando ainda cursava a graduação em Comunicação Social, engravidou de seu filho Matheus e conta que foi um período bastante difícil, pois “precisava sobreviver”.
Além disso, a baiana pontua que “A vida foi minha maior mola propulsora”. Ao contrário de tantas amigas que viviam o auge dos 20 anos, preocupando-se apenas com a vida social na cidade e as disciplinas vigentes do curso, trabalhava arduamente e usava todo seu salário para pagar o leite do filho e a babá, com quem ele ficava em casa.
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Como muitas profissionais, Juliana ela veio para São Paulo no intuito de fazer seu nome na área de Comunicação. Assim, trabalhou em grandes agências e empresas do ramo de comunicação.
Atuou na In Press Porter Novelli, onde trabalhou com Kiki Moretti; no Grupo Glamurama, ao lado de Joyce Pascowitch, onde alcançou todo o networking do qual desfruta hoje, conforme conta; MChecon Design Cenografia; e, por fim, na Holding Clube, na qual hoje é sócia de José Victor Oliva.
Na Holding Clube, é líder de negócios e relações públicas, entregando eventos do porte do Torcida N1, uma festa cross media pensada com intuito de acompanhar e comemorar o futebol jogado pelo Brasil na Copa do Mundo do Catar, realizado até quando o Brasil caiu diante da Croácia, nas quartas de final.
Antes de chegar ao cargo que ocupa hoje e se tornar referência para outras mulheres, Ju Ferraz passou por duas crises de burnout na vida. Quando estava no auge da segunda, já trabalhando na Holding Clube, ela encontrou José Victor Oliva num evento.
A baiana conta que ele lhe estendeu a mão para que ela pudesse seguir se tratando, por um período de cerca de seis meses a partir desse encontro, sem descontar seus salários, em um contexto em que a síndrome sequer era reconhecida como uma doença ocupacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Com isso, no período de um ano, ela assumiu o cargo de sócia-diretora na Holding Clube.
Segundo ela, a atitude de Oliva foi fundamental para que ela pudesse se tornar a mulher que é hoje. Com essas quedas e ascensões na vida pessoal e profissional, ela passou a se “mostrar vulnerável nas redes sociais para poder ajudar as pessoas, no sentido de desmistificar ou de me identificar com pessoas que estavam passando pelo burnout.
Relata que fez isso “literalmente contando a minha própria vida nas redes sociais, e dando voz e palco — pela visibilidade que eu já tinha — para outras mulheres, para outras práticas, para histórias bem-sucedidas, para pessoas que tinham se superado”. Seu intuito era que “a gente fizesse desse mundo um lugar melhor” — o que ela estabelece como propósito de vida.
Juliana entende que tem uma responsabilidade pessoal com mulheres cujas histórias são parecidas com a dela, de forma que faz questão de incentivá-las a trilhar um caminho de autoconhecimento e consequentemente empoderamento e empreendedorismo da própria vida.
“Cresci ouvindo que, por todas as minhas características — ser uma mulher baiana, uma mulher gorda, nordestina, não ter me formado numa faculdade melhor e meu inglês não ser sensacional — eu não ia chegar onde eu queria. E eu estou aqui!” – Juliana Ferraz
Diz ainda tem que um futuro ainda por vir, com muitas coisas pra fazer. “Toda vez que uma mulher achar que ela não pode fazer, porque isso ou porque aquilo, ela tem um exemplo positivo do outro lado da tela, na rede social, em entrevistas como esta. Ela deve acreditar no seu sonho”, defende.
E antes de servir de inspiração para outras mulheres, Ju Ferraz teve inspirações em casa, na própria família: “Sou uma mulher nascida numa família de mulheres muito fortes”. Além de sua mãe, grande referência e incentivadora, tem duas mulheres na família muito importantes: sua avó Julita, falecida em 2020, que durante a vida lecionou Português, Latim e Francês, e quem definiu como “uma mulher a frente de seu tempo”; e a tia Monique Gardenberg, quem foi seu grande farol no ramo da moda.
Acerca da sua tia, conta: “Foi ela quem me fez gostar de moda, de experiências, shows e entretenimento, porque ela foi uma das primeiras mulheres brasileiras a fazer eventos populares no país. Ela é a criadora do Tim Festival, Free Jazz e foi ela quem trouxe a Madonna para o Rio de Janeiro pela primeira vez. E eu cresci ao lado dessa mulher. Quando meu pai morreu, ela cursava cinema no exterior, e eu lembro que ela ia à Nova York e voltava com as maquiagens da MAC, ia ao Rio de Janeiro e trazia bolsas de plástico do Gilson Martins na época. Então, talvez, sem ela perceber, ela me trouxe até aqui”. Hoje, morando em São Paulo, na região de Higienópolis, Ju Ferraz é vizinha da tia, e acompanha seus passos, empreendendo no mercado da moda com seu e-commerce de re-sale chamado Novo Luxo.
Para além das familiares, destaca Joyce Pascowitch, que foi sua mentora por cerca de dez anos; Kiki Moretti; e Ana Raia, sua grande coaching, que a ajudou em sua “transformação e libertação da mulher que é”, pois ela diz que “tinha muitos medos, muitas inseguranças e bastante dificuldade de me entender como ser humano”. Graças ao trabalho realizado com Ana, a baiana conseguiu “planejar a mulher que queria ser” e se empoderar.
Ju cita o romance ‘Torto Arado’, de Itamar Vieira Junior, para descrever sua missão de vida: assim como as personagens conterrâneas Bibiana e Belonísia, que com seus facões vão abrindo estradas, Juliana se vê, muitas vezes na vida, “com um facão na mão, abrindo caminhos para outras mulheres”.
Apesar de sempre ter sua história abordada principalmente pelo prisma do trabalho, Ju Ferraz pontua que é preciso empreender, sim, mas em todas as áreas da vida:
“É importante dizer: o trabalho é só o trabalho, ele é uma parte importante da nossa vida, mas ele não é o todo. A gente cresce — porque a gente quer alcançar voos e lugares, cadeiras e dinheiro — entendendo que o trabalho deve ser a nossa prioridade. O trabalho não é prioridade”. – Juliana Ferraz
Atuando na Holding Clube, mantendo seu e-commerce Novo Luxo, inspirando e conversando diretamente com suas seguidoras nas redes sociais, palestrando e escrevendo colunas, e também prestando uma espécie de consultoria ao Instituto Plano de Menina, Juliana precisa cuidar de sua agenda, para conseguir cumprir todas as suas obrigações e, também, manter-se conectada consigo.
“Por ter a vida muito atribulada, eu me recolho muito. Eu me tornei uma mulher muito recolhida na minha vida pessoal, e recolhida no sentido de menos eventos sociais, menos ‘oba-oba’, porque isso já faz parte do meu trabalho. Então, meus momentos de lazer são para algo interno: ficar na minha casa, ver documentários, ler livros, ver filmes e, às vezes, vou te contar, não fazer nada. Simplesmente ficar no meu quarto, acender uma vela cheirosa, apagar as luzes, fazer exercícios de respiração para que eu consiga oxigenar a cabeça e que eu siga para o próximo desafio”, conta.
Ela busca momentos para estar com seu esposo, Bruno, seu filho Matheus e, ao menos digitalmente ou por ligação, com a mãe, dona Luiza, que reside em Salvador. “Eu ligo pra minha mãe cinco, seis vezes ao dia, porque quero saber como ela está. É uma forma de eu me oxigenar, estar ali, cuidando de mim, mas cuidando dela, que me gerou. Isso tudo me faz bem”.
A influenciadora comunicou em suas redes sociais, neste ano, que está escrevendo um livro sobre sua vida. Segundo ela, não será exatamente uma autobiografia, mas sim um livro de memórias, com as passagens mais desafiadoras de sua trajetória, e seu objetivo é que sua história sirva como uma espécie de bússola para outras mulheres.
“Acho que a beleza da minha história de vida é que eu sou uma mulher comum, como qualquer outra. Então, é sobre isso: cair e levantar; cair e não desistir; cair e seguir com amor a vida, com orgulho das dores, das histórias e dos aprendizados”. – Juliana Ferraz
Sobre o processo de escrita, ela diz: “É muito lindo o escrever, mas é muito doloroso voltar no passado. Às vezes, eu travo nas partes mais difíceis da minha vida. Por exemplo, a questão da morte do meu pai, da perda da minha estabilidade financeira, de quando eu me entendi como gente, como uma mulher gorda, o que eu sofri de bullying… Mas, ao mesmo tempo, tem uma beleza nessa dor, tem uma beleza nessa experiência, nesse conhecimento, que é belo porque eu quebrei as barreiras. É belo porque eu hackeei o sistema”.
O lançamento está previsto para março de 2023, pela Editora Nacional, e acontecerá inicialmente em Salvador, na Bahia, sua terra natal.
Por fim, perguntada sobre qual frase usaria para se definir, a baiana declara ser “uma sobrevivente”. Complementa dizendo: “Eu sobrevivi a todas as durezas da minha vida, e eu acho isso lindo. Essas durezas me trouxeram até aqui. Essa mulher que eu sou hoje é muito por conta das minhas dores e das minhas perdas. Não posso tornar isso mágico, porque não foi, mas isso me deixou forte, me empurrou pra chegar até aqui”.
E mesmo tendo alcançado dias de vida mais confortáveis, como sonhava aos 20, na Bahia, ela segue com os pés no chão, reconhecendo os limites entre a singularidade e a pluralidade da própria história. “Eu não sou, estou mulher de sucesso. Conquistei muitas coisas, mas a melhor coisa que eu soube fazer na minha vida, até hoje, foi ser empreendedora da minha vida pessoal”, explica.
“Eu desejo que as mulheres sejam empreendedoras das próprias vidas pessoais. Esse empreender tem a ver com gerir as suas vontades e seus medos, seus sonhos, as suas angústias”. – Juliana Ferraz
A comunicadora acredita que nós, mulheres, não podemos pensar só na vida profissional. “Ela não nos torna felizes, ela não cria só vínculos, ela não faz com que a gente viva só momentos. Então, é preciso saber equilibrar e empreender nas diferentes áreas da vida”, encerra Juliana, preparando-se para seguir abrindo mais caminhos, como Bibiana e Belonísia.
Veja imagens de diversos momentos importantes e inspiradores da comunicadora e influencer e, assim, conheça mais sobre sua história:
Formada em Jornalismo, é apaixonada por livros e boas histórias (ficcionais ou não). Trabalha com conteúdo e fotografia, e nas horas vagas gosta de ler, escrever e pedalar.