Mulheres inspiradoras: Marielle Franco
Defensora das minorias, Marielle deve ser sempre lembrada como a voz que nunca vai ser calada
Muito se ouviu falar de Marielle Franco nos últimos dias. Assassinada a sangue frio com quatro tiros na cabeça, sua voz foi calada. Mas o que muitos não esperavam, é que sua voz se ecoaria com a indignação de todos que defendem e acreditam nos mesmos ideais que ela vinha lutando.
Mulher, mãe, negra, moradora da favela e defensora das minorias, Marielle lutava por uma sociedade mais justa e com menos desigualdade. E o que diferencia seu assassinato de tantos outros que acontecem diariamente? Toda morte, ainda mais violenta, é um pesar, mas a morte de Marielle significa muito mais, junto com um corpo e uma história, morreu também a voz de uma resistência que lutava por tantas outras vozes.
Trajetória de Marielle Franco
Marielle nasceu em 1979, no Rio de Janeiro, e foi criada na favela da Maré, comunidade onde ela iniciou sua participação política na militância pelos direitos humanos.
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No ano de 2002, ingressou como bolsista na graduação de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Marielle também era mestra em Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense.
Sua carreira na política começou em 2006, quando foi nomeada assessora parlamentar do deputado Marcelo Freixo. Mais tarde, ela assumiu a coordenação da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Após 10 anos, ela foi eleita vereadora na cidade do Rio de Janeiro e passou a integrar a comissão que acompanhava de perto a Intervenção Militar na cidade fluminense.
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Projetos de lei
Como vereadora, Marielle criou e participou de vários projetos de lei. Os mais expoentes são a Lei das Casas de Parto, que promoveria mais dignidade, segurança e conforto para moradoras de zonas da cidade com IDH baixo; o Espaço Coruja, que tem como intuito acolher crianças no período noturno, enquanto seus responsáveis estão fora de casa para trabalhar ou estudar; e também o projeto que visa conscientizar sobre o aborto, já legalizado em casos de estupro, risco de morte da gestante ou anencefalia do bebê, mas que ainda é mal visto e é alvo de inúmeros casos de denúncias sobre violência obstétrica.
Marielle também lutava por incluir dias para fortalecer causas específicas no calendário da cidade, como por exemplo o dia da luta contra a homofobia, o dia da visibilidade lésbica e o dia de luta contra o encarceramento da juventude negra.
Feminismo na prática
O feminismo na teoria muitas vezes não chega a quem mais precisa dele. Em uma de suas entrevistas, Marielle diz que os três pilares de sua campanha eram o debate de gênero, o debate de raça e a luta por melhorias na cidade como um todo. O debate de gênero ao qual ela se refere não fica só em seus estudos e nas conversas que tinha com a comunidade acadêmica e elite intelectual, falando de termos específicos que dificilmente serão acessíveis às moradoras das comunidades carentes que sofrem violência doméstica, por exemplo. Marielle se propunha a falar sobre vagas em creches, sobre o lugar que essas mulheres ocupam na favela e também sobre a vulnerabilidade a que elas estão expostas. Ela acreditava que, antes de dialogar sobre temáticas mais delicadas, essas mulheres precisavam ser empoderadas e conscientizadas sobre seus direitos e o peso que têm dentro de uma sociedade tão desigual e violenta.
“Sobreviver é a nossa maior resistência”
É com essas palavras que Marielle resume toda sua luta. Em um vídeo divulgado em seu canal do YouTube em 2016, ela fala sobre o papel das mulheres moradoras das comunidades carentes: “Nossa voz, muitas vezes silenciada, terá de ser ouvida”. A voz de Marielle foi calada e não é por acaso que ela disse “nossa” voz. Marielle resistiu até que forças externas cessaram sua voz, foi aí que ela não pôde sobreviver mais. Ainda nesse vídeo, ela diz ser força porque todas nós também somos, já que uma luta é mais forte quando mais pessoas acreditam nela.
O que você pode aprender com Marielle Franco
1. Lute pelos seus direitos
Nós vivemos em um estado que, por mais que não pareça, é democrático. Temos direito de ir e vir e também de expressar nossas opiniões. Marielle morreu lutando pelos seus e pelos nossos direitos, mas isso não deve nos assustar.
É preciso crer que toda luta pode obter resultados, por menores que eles sejam. Todo ser humano é digno de ser ouvido e de ter seus direitos respeitados.
2. Lutar por direitos humanos não é sinônimo de “defender bandido”
Propagar que alguém deve ser morto não é opinião, é discurso de ódio. Marielle defendia que a Declaração Universal dos Direitos Humanos fosse colocada em prática. Defender os direitos humanos não significa passar a mão na cabeça de criminosos, mas significa lutar para que eles possam pagar por seus crimes em condições menos precárias. É lutar para que todos os cidadãos tenham direitos iguais, e isso inclui também os criminosos.
3. A juventude negra precisa ser ouvida
De acordo com o Mapa da Violência de 2015, o número de mulheres negras assassinadas entre os anos de 2003 a 2013 aumentou 54%, enquanto caiu 10% o número de execuções de mulheres brancas. Todas nós sabemos que isso não é uma coincidência. Não podemos julgar uma realidade que não vivemos, mas podemos dar voz a quem presencia esse cotidiano de exclusão e violência.
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Outro dado que choca é a porcentagem de negros correspondente aos assassinatos no Brasil. A cada 100 pessoas mortas pela violência, 71 são negras. Essa é uma parcela da sociedade esquecida e a morte desses indivíduos é cada vez mais banalizada. Marielle lutava pela igualdade e por condições mais justas a essas pessoas que sofrem todos os dias com o descaso das políticas públicas e com uma sociedade que ainda enxerga os negros com olhos de preconceito.
4. A comoção é de todos nós
Sempre choramos e nos comovemos com a morte dos nossos. Nossos amigos, nossos familiares… E sabe por que a comoção da morte de Marielle é de todos nós? Porque ela era nossa voz. Talvez você nem soubesse quem era Marielle antes da notícia de sua execução ser veiculada em todos os cantos. Mas, com um pouco de pesquisa – e de mente aberta -, é possível saber que Marielle morreu por defender com bravura tudo aquilo que nós conversamos na mesa do bar com os amigos ou então em um bate papo no WhatsApp e depois retomamos nossa vida normalmente. Marielle respirava essa luta, suas reivindicações eram o que a guiava todos os dias e é por isso que a comoção foi e deve mesmo ser generalizada. Precisamos de mais pessoas como Marielle, precisamos eleger mais Marielles, criar Marielles, ser mais como a Marielle.
Mais uma vez, é muito preocupante se deparar com o fato de que alguém morreu por defender tudo aquilo em que acreditamos.
Beatriz Castells
Comunicóloga, especialista em moda, sagitariana em busca de coisas que me tiram do tédio e apaixonada por comentar looks de red carpet.